Crisromerson de Lima Xavier Caires
Advogado, Pós-Graduado em Direito e processo Penal pela ABDCONST.
Resumo
O presente artigo busca uma reflexão do atual cenário da responsabilização dos sócios e administradores nos crimes contra ordem tributária e utilização pela administração pública do direito penal como meio coativo de cobrança tributária. Como o judiciário está tratando do tema é de extrema importância, considerando atuais decisões dos tribunais e certa tendência repressiva do direito pen...
Crisromerson de Lima Xavier Caires
Advogado, Pós-Graduado em Direito e processo Penal pela ABDCONST.
Resumo
O presente artigo busca uma reflexão do atual cenário da responsabilização dos sócios e administradores nos crimes contra ordem tributária e utilização pela administração pública do direito penal como meio coativo de cobrança tributária. Como o judiciário está tratando do tema é de extrema importância, considerando atuais decisões dos tribunais e certa tendência repressiva do direito penal no aspecto tributário, portanto necessária atenção ao tema, questionando-se: ser sócio ou administrador da pessoa jurídica é o suficiente para uma imputação de responsabilidade penal? Judiciário brasileiro é conivente com uma responsabilidade objetiva criminal? Administração pública utiliza o direito penal como meio coativo para cobrança de tributos? Extinção de punibilidade nos crimes contra ordem tributária pode ser considerado um planejamento tributário?
Palavras-chave: Crimes contra ordem tributária – responsabilidade penal dos sócios – cobrança coativa de tributos – criminalização dos sócios – extinção da punibilidade – planejamento tributário – direto penal.
1. Introdução
Paiva{C}[1] destaca que grande finalidade da Lei 8137/90 (Crimes contra a Ordem Tributária) é para proteger a ordem tributária como um todo, bem como o interesse da arrecadação, inclusive, quando diz respeito à extinção da punibilidade como estratégia. Entretanto, sem deixar de lado a existência da excessiva criminalização e imputação indiscriminada contra os indivíduos, acionistas e administrador da empresa, levando grande insegurança jurídica, sucessivamente, minando atividade econômica como um todo.
Em tempos atuais vivenciamos uma verdadeira batalha entre empresários x gana insaciável do Estado pela cobrança de tributos, em meio uma crise política econômica, cada vez mais se prolifera condutas para criminalizar o empresariado brasileiro, como se fosse bandido ou culpado pelos desmandos de um Estado mal administrado.
Oferecimento de denúncias em face aos sócios ou administradores das empresas, geralmente são baseadas somente ao fato do cargo em que se ocupa, deixando de lado indícios de sua autoria suficiente para justificar propositura de ação penal, certo que não basta simples condição de sócio ou diretor da empresa para que alguém seja responsabilizado penalmente.[2]
O presente artigo não busca nenhuma apologia ao não recolhimento de tributos, ao contrário, sabe-se que as necessidades básicas de qualquer estado são supridas em sua maioria pela arrecadação tributária. Entretanto, o que se percebe é que muito se fiscaliza, puni e cobra, mas, esquece a existência de uma das maiores tributações a nível mundial, acompanhada por um emaranhado de obrigações principal e acessória que muitas vezes acaba levando o empresário para informalidade condicional de sobrevivência.
Nesse contexto o judiciário vem se posicionando de maneira político econômico, quando se fala no aspecto de crimes tributários e responsabilidade penal, criando mecanismos legais e coativos para administração pública cobrar seus débitos fiscais, deixando o empresário em uma situação desproporcional e fora do contexto de nosso ordenamento jurídico pátrio.
Não sendo recente a grande dificuldade para se identificar eventual responsabilidade penal de sócio ou administrador, gerando grandes controvérsias e debates ao tema, mas, que infelizmente percebe-se uma adoção pela imputação da responsabilidade objetiva ao empresário, contrariando nosso sistema jurídico penal.
{C}2. Responsabilidade penal do sócio e administrador
Dentro de nossa estrutura normativa penal se faz necessário que sua imputação tenha como referência um responsável que executa diretamente determinado comportamento proibido, entretanto, quando falamos em um contexto que envolve atividade econômica, surgi diversos desafios para imputação de uma responsabilidade individual. No conceito de empresa indica várias características como pluralidade de agendes e divisão de tarefas com participação de várias pessoas, esse panorama de estrutura em sintonia com processo econômico resulta em grandes impactos aos bens jurídicos afetados. [3]
Não podemos deixar de lato que o fato típico necessita de uma conduta dolosa ou culposa, Capez{C}[4] define a conduta como ação ou omissão humana, consciente e voluntária, dirigida a uma finalidade. Ainda ressalta que os seres humanos são entes dotados de razão e vontade, logo, a mente irá processar uma série de captações sensoriais, transformadas em desejos, mas, o pensamento enquanto permanecer somente em sua consciência não pode representar nada ao Direito Penal.
Isso fica muito claro que diferentemente do Direito Cível, onde existe uma previsão para responsabilidade objetiva, não é admissível ao Direito Penal, surgindo o grande fator e justificativa ao estudo na responsabilização em matéria tributária quando envolve a figura dos sócios e administradores.
Sabe-se que qualquer empresa minimamente organizada, possui divisões de tarefas, departamentos e sócios somente de capital ou de capital e gerencia, logo, eventualmente questões criminais tributárias seriam aplicadas a eles, simplesmente por atribuição de função ou posição em estatuto social? O presente estudo busca uma reflexão de como atualmente esses conceitos estão sendo considerados em matéria tributária.
Veja que em nosso ordenamento jurídico (Código Civil) não há dúvida na atribuição de personalidade à pessoa jurídica, deixando claro sua autonomia patrimonial em relação aos sócios que há integram.
Entretanto, no direito penal essa regra resta excepcional, atribuindo responsabilidade penal ao individuo sócio, principalmente quando se fala na responsabilização criminal da pessoa jurídica em crimes tributários.
O código Penal brasileiro contempla algumas matérias atinentes aos crimes tributários, mas, é na lei 8137/90 que define os crimes contra ordem tributária, tornando-se importante uma conexão ao direito tributário que irá auxiliar em termos utilizados aos tipos penais contidos no dispositivo legal.
Assis{C}[5] conclui acerca de delitos tributários um círculo restrito de autores, em delitos especiais, onde os sócios e administradores podem ser responsabilizados caso sejam inseridos nesse círculo, considerando que em regra recai sobre a pessoa jurídica, mas, essa não pode ser autora, sendo as pessoas que controlam os portadores do dever penal contido nos tipos penais tributários, podendo afirmar que aos sócios e administradores cumpre pessoalmente tais deveres, ao menos quando delega a terceiros, ficando responsável pela coordenação e vigilância.
Nesse contexto é importante identificar alguns aspectos a responsabilidade, Prado[6] identifica ao aspecto obrigação tributária principal e acessória, naturalmente a pessoa designada como contribuinte pela legislação, bem como ao terceiro que por força de lei ocupa o campo da substituição e transferência; deixando para esfera penal ao agente do delito que comete ação ou omissão. Inclusive não seria necessária sua participação em determinada conduta, bastando seu conhecimento e proveito na supressão ou redução de tributo.
Em outra opinião é indispensável que os sócios venham a contribuir efetivamente na pratica criminosa, sendo determinante sua intervenção para fraudar lei tributária, logo, não seria suficiente somente o cargo ocupado ao domínio do fato criminoso.[7]
Dentro de um preceito constitucional e infraconstitucional revela-se uma responsabilidade pessoal, acrescido de uma conduta (ação ou omissão) individual, nosso ordenamento jurídico está enraizado na dignidade da pessoa humana, não admitindo responsabilização objetiva.[8]
Investigando imputação de responsabilidade penal aos sócios ou administradores; pode ser com base em uma estrutura horizontal e vertical, na primeira situação em que departamentos trabalham lado a lado com divisão de funções, já no aspecto vertical falamos em diversos ambientes com delegação de funções ou tarefas, podendo existir ou não subordinação{C}[9]
Almeida{C}[10] destaca dificuldade à determinação ou individualização da conduta criminosa na atividade empresarial, considerando somente à condição jurídica da participação do titular da empresa como figurou em instrumento social, ao invés de buscar sua efetiva participação no evento criminoso, conseqüente, inversão probatória na dogmática penal, o que é inadmissível.
Todas as discussões acabam em uma linha de raciocínio que sócio ou administrador irá responder por crime não pela sua função, mas, se realmente concorreu para que o fato fosse praticado, não deixando de lado que a responsabilidade penal em nosso ordenamento jurídico penal é pessoal. Sem dúvida que o elemento subjetivo do crime (dolo ou a culpa) deve estar presente ao fato, logo, não se pode atribuir uma responsabilidade solidária somente porque o individuo ocupa gerencia da empresa ou faz parte da pessoa jurídica, estaria punindo por responsabilidade objetiva, inviabilizando ampla defesa. Ainda, uma questão de extrema importância quando na invocação da teoria do domínio do fato, é de que não pode ser um elemento suficiente ao Ministério Público como ônus de comprovar, bem como o juiz em sua sentença em elementos de convicção que o individuo concorreu ao fato criminoso. [11]
Nesse mesmo entendimento em matéria publicada{C}[12] sobre decisão do Ministro Celso de Mello, fica claro a idéia de que não se pode criminalizar participação societária numa empresa, ainda, acusação de alguém por ilegalidades cometidas por uma pessoa jurídica, seria no mínimo descrever a participação do acusado no crime.
Portanto, a doutrina em sua grande maioria trabalho no aspecto de que há necessidade em demonstrar conduta efetiva ao fato criminoso, seja ela pela ação ou omissão, logo, concluímos que uma conduta penalmente relevante deve ser enraizada de uma ação ou omissão, seguindo na mesmo linha de Capez{C}[13]:
“Por essa razão, refazendo, agora, o conceito de conduta, chega-se à seguinte conclusão: conduta penalmente relevante é toda ação ou omissão humana, consciente e voluntária, dolosa ou culposa, voltada a uma finalidade, típica ou não, mas que produz ou tenta produzir um resultado previsto na lei penal como crime.”
{C}3. Administração pública, Judiciário na responsabilidade penal dos sócios e administradores
O cenário atual preocupa muito ao aspecto da criminalização empresarial, uma vez que mera condição de sócio ou administrador é suficiente para uma responsabilização, não sendo razoável nos crimes contra ordem tributária, até porque determinada posição exercida dentro da estrutura organizacional constitui um elemento objetivo, e fator subjetivo em uma questão psicológica do consentimento.
Os tribunais estão se utilizando da Teoria do domínio do fato de forma equivocada nos crimes contra ordem tributária, para reconhecimento de culpabilidade; ignorando o que é autor e partícipe no campo de responsabilidade e aplicando somente o fator de posição ocupada na estrutura da empresa, criando uma responsabilidade penal objetiva, o que é inaceitável. [14]
Não se pode dissociar em matéria de delito tributário elemento subjetivo específico, quando consiste na vontade de fraudar a arrecadação, entretanto, o que mais se observa na administração pública em tempos atuais; é um procedimento administrativo de fiscalização ou investigação até o processo penal como meios coativos de cobrança tributária.
O poder judiciário vem sendo fortemente influenciado pela opinião publica, principalmente depois da operação lava jato, nos crimes de ordem econômica, decidindo muitas vezes em contraste com ordenamento jurídico na responsabilidade do individuo sócio da pessoa jurídica.
Em matéria publicada sobre o STJ que analisou acusação do Ministério Público/PB, de empresas construtoras em processo licitatório obrigatório, tornam-se preciosas as lições da ministra Laurita Vaz, quando aponta que não foi demonstrada a mínima relação entre os atos por ele praticados e os delitos que lhe foram imputados. Limitou-se em fazer três referências a essa condição de acusados, não demonstrando minimamente nenhum nexo entre ação dos agentes e a suposta prática ilegal, sucessivamente, constituindo a famosa acusação genérica, consignando o presente nos crimes de ordem econômica{C}[15]{C}.
Outro caso extremamente emblemático que gerou grande repercussão, principalmente ao direito penal econômico, foi julgamento do STF em criminalizar o não pagamento de ICMS.
Abrindo idéia de que há outros tributos também de ordem econômico inseridos no preço final dos produtos que podem seguir a mesma lógica, destacando-se novamente o meio coativo de cobrança, esquecendo técnica jurídica e levando em consideração aspectos econômicos.
Verdade seja que em matéria tributária inadimplência torna-se ilícito penal ao invés de ilícito fiscal, apesar do STF restringir apenas ao devedor contumaz, inclusive neste aspecto permanece em debate no congresso o projeto de Lei 1646/2019. [16]
Mas a grande interrogação que surge é em relação ao pagamento ou não do tributo, Scandelari {C}[17]entende que o simples inadimplemento, não pode ser visto como crime, desde que não seja eivado de má-fé, no entanto, ressalta que consciência ou intenção do recolhimento trata de um elemento subjetivo fundamental.
Em recente sentença{C}[18] de um cliente, felizmente absolutória, mas por outro lado, preocupante pela visão do judiciário. No caso em especifico quando o D. Magistrado enfrenta preliminar (inépcia da denúncia), deixa claro que entendimento majoritário dos Tribunais de Justiça é de que mesmo a denúncia sucinta, mas com elementos que indica indícios de autoria e materialidade não deve ser considerada inepta.
Importante nesse aspecto identificar denúncia genérica em relação denúncia geral, uma vez que não se pode admitir a genérica, mas é possível uma denúncia geral, mesmo não detalhando minimamente ações dos imputados, esteja demonstrando sutilmente ligação de suas condutas e fato delitivo.{C}[19]
De fato está se criando um combate direto às empresas que adotam como meu de estratégia não recolhimento de tributos, causando desequilíbrio econômico, por outro lado, não leva em consideração que; muito se fiscaliza, puni e cobra, mas, esquece que nossa carga tributária é uma das maiores a nível mundial, sem contar o emaranhado de obrigações principal e acessória que muitas vezes acaba levando o empresário para informalidade condicional de sobrevivência.
Nosso sistema tributário no aspecto obrigações principais e acessórias em sua complexidade leva muitos empresários ao ilícito, por desconhecimento da própria lei, Machado[20] destaca:
“Em princípio a ignorância da lei não exclui a responsabilidade por seu cumprimento. Ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece. Nada, porém, é absoluto, tanto que mesmo o Direito Penal, embora diga que “o desconhecimento da lei é inescusável”, admite que “o erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço” (CP, art. 21). E responde pelo crime o terceiro que provoca o erro(CP, art. 20 § 2º).
Assim, não é razoável punir-se o contribuinte que descumpre uma lei tributária porque a desconhece, especialmente quando esse desconhecimento pode, em certa, medida, ser imputado ao próprio ente tributante.
Ocorre que Código Tributário Nacional estabelece para os Poderes Executivos Federal, Estaduais e Municipais a obrigação de consolidar anualmente, mediante decreto baixado até 31 de dezembro de cada ano, a legislação de cada um de seus tributos. Se o Poder Executivo – vale dizer, a isto contribui para o desconhecimento da lei tributária, é justo entender-se que não poderá punir o contribuinte que descumpri a lei tributária. Pode, certamente, exigir o tributo. Neste aspecto aplica-se o princípio segundo o qual ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece. Não, porém, punir o contribuinte autor de infração para cujo cometimento contribuiu, não cumprindo o seu dever legal.”
Haidar{C}[21] em matéria publicada fixa um ponto de extrema importância que ocorre com freqüência em procedimentos administrativos de fiscalização, não são raras atuações do fisco com lançamentos inadequados as questões fáticas, ele ainda destaca, uma forte pressão governamental em metas de finança nunca atingidas. O que chama atenção aos olhos são as normas legais ignoradas pela administração pública e seus agentes.
Nessa vertente, Scandelari {C}[22]analisa entendimento do STF e STJ no que tange ao prazo prescricional em crimes tributários, para ele: não é razoável que o prazo prescricional tenha seu inicio com o lançamento do crédito fiscal, uma vez que não possui nenhuma conexão com o momento consuntivo do crime, até porque é um ato da administração pública, finaliza que única orientação aceitável é o dia em que ação ou omissão foi praticada pelo acusado.
Todo e qualquer contribuinte aos olhos do fisco é sonegador, muitas vezes nos deparamos com situações realmente arbitrarias, certo atendimento que realizei; em que o contribuinte tinha sua inscrição no cadastro nacional de pessoa jurídica (CNPJ), simplesmente, inapto pela Receita Federal, sem ao menos qualquer notificação oportunizando ampla defesa e o contraditório, levando ao contribuinte reverter sua situação com deferimento de liminar, posteriormente ratificação em sentença, e confirmação junto ao TRF 4ª [23]
Bezerra{C}[24] analisa aspecto em que o fisco realiza levantamento de provas para autuação fiscal, pelo auto de infração, elabora relatório fiscal que será destinado ao Ministério Público, com relato do modus operandi do contribuinte, em regra, sempre afirma que o contribuinte tentou sonegar tributos de maneira ardilosa, encaminhando relatório ao MP para fornecer embasamento ao oferecimento de denuncia por suposto crime cometido, normalmente descrevendo de maneira genérica conduta do contribuinte.
São inúmeras as opiniões e situações em que a denuncia genérica é uma realidade em crimes contra ordem tributária, bem como aceita em nosso judiciário, deixando a mercê empresas e seus sócios e administradores.
Em tempos atuais abriu espaço para práticas abusivas pelo fisco, com oferecimento de denúncia aos sócios, administradores das empresas somente por serem titulares do cargo, ou constar em contrato social, sem a presença de indícios de autoria suficiente. Por outro lado, inadequada imputação de conduta criminosa ao contribuinte pode ensejar delimitação da responsabilidade do Estado e do agende público vinculado ao fisco.[25]
Não há como negar que criminalização tributária tornou-se auxiliar para arrecadação, extrapolando os limites do direito penal, Scandelari[26] em sua obra afirma:
“(...) Veja-se que, de acordo com essa visão, teria o legislador pretendido que a função da criminalização da sonegação fiscal fosse precipuamente a de “encorajar” o devedor a quitar o débito, o que assistiria o estado na sua tarefa arrecadatória.Ocorre que essa – aparentemente – singela interpretação acaba por extravasar os limites do Direito Penal, ao negar-lhe sua finalidade.”
Felizmente há decisões no judiciário que desperta a chamada luz no final do túnel, mesmo em tempos de criminalização pelo administrativo e judiciário, utilizando o direito penal como meio coativo para cobrar tributos.
Em opinião sobre recente julgamento do TRT3ª por votação unânime da 11ª turma, ao se deparar em um cenário de dúvida na existência do dolo, acolhe recurso da defesa absolvendo uma empresária. Não sendo nenhuma anormalidade da justiça pela aplicação da lei aos crimes tributários, afastando-se freqüentes responsabilizações objetivas com empresários denunciados somente pela sua posição societária ocupada, deixando de analisar atos ou omissões próprias.
Realmente o julgamento traz consigo mérito de ajustar as coisas no aspecto criminal tributário, bem como um recado para automatização processual, mas, principalmente falha dos tribunais em identificar efetiva presença de dolo na conduta do individuo empresário dentro da instrução criminal.{C}[27]{C}
Com todos os acontecimentos no cenário empresarial atual, não está longe a pratica pelo empresário brasileiro e governança tributária o chamado Compliance, apresentando-se como inevitável para oxigenar o ambiente dos negócios em nosso país, trazendo questões de condutas éticas e praticas de governança tributária.
Pode dizer que no Brasil a maior inspiração foi com advento da Lei 13.246/2019, definindo princípios entre contribuinte e administração pública, bem como trazendo incentivos de boas práticas, é um caminho sem volta, Lei anticorrupção privilegia e incentiva cooperação em eventuais investigações e modificação relação fisco x bom contribuinte. [28]
{C}4. Extinção da Punibilidade, sócios e administradores
Apesar do direito penal ser ultima ratio, quando sua utilização deve ser em situações extremamente necessárias, não é o que se vem observando em matéria de ordem tributária, administração pública sem dúvida se utiliza da aplicabilidade penal como meio coativo de cobrar tributos. De forma alguma o presente artigo fomente o não pagamento de tributos, ou o direito da administração pública em poder cobrar seus débitos fiscais, entretanto, o poder-dever do Estado não pode violar princípios e direitos constitucionais garantidos em nosso ordenamento pátrio.
Nesse contexto Scandelari{C}[29], trabalha em sua obra que obrigações fiscais podem ser satisfeitas pelo pagamento, parcelamento, e outras formas de ressarcimento, logo, não haveria necessidade em agir pelo Ministério Público, mesmo com ausência de questões praticas o ultimo ratio não deve ser posto de lado. Destacando que em certas situações a restrição de liberdade, estaria longe de ser a melhor solução, bem como intervenção mínima e subsidiária do Direito Penal.
Não há dúvida que o Brasil vem passando por uma intensa crise, que atinge diretamente os empresários, mas, o que se verifica é uma total insensibilidade da administração pública no aspecto tributário, cada vez mais voraz pela arrecadação, inclusive, utilizando-se do direito penal para cobrança de seus débitos fiscais.
Junior{C}[30] ressalta que maior preocupação do Estado não fixa em punir conduta pela ação ou omissão do contribuinte em crimes tributários, mas, o recebimento do tributo, passando o caminho da ação penal por uma opção viável, com resultados interessantes, substituindo cobrança na esfera cível. Sem dúvida que o cenário criado pela própria administração publica estimula e desperta atenção, inclusive, ao planejamento ao sonegador contumaz. Considerando que sua prática em não sendo alcançada pela fiscalização tributária, posteriormente pilhada pela fiscalização, além das garantias ao processo administrativo, em situação de denúncia, pode ainda optar por um parcelamento ou até mesmo um liquidação pelo pagamento do tributo.
Independente da Lei 8137/90 em tipificar sanções penais, o sistema penal tributário sempre beneficiou a extinção da punibilidade ao agente que efetuasse o pagamento tributário, em contrapartida, substituindo pretensão estatal de punir o infrator presente sistemática da extinção ou suspensão pelo pagamento do débito, permeada de péssimos incentivos, um circulo vicioso onde o sistema tributário é excessivamente oneroso, complexo e irracional; contribuinte foge da tributação e o Estado precisa da arrecadação, criando incentivos para autuações arbitrárias, por outro lado, anistias, moratórias para evitar punibilidade penal com a finalidade de um alívio fiscal e o sistema continua ruim.{C}[31]
Outro aspecto que não se pode deixar de lado ao tema é a Lei 13964/2019, venho como um desafogamento para redução da morosidade e racionalização do sistema, chamando atenção em relação à persecução penal que abre a possibilidade do acordo de não continuidade da ação penal por se tratar de norma processual mais benéfica, flexibilizando disponibilidade para negociar entre Ministério Público e Defesa, não existindo qualquer proibição aos tipos penais tributários, ficando somente para uma discussão mais aprofundada ao afastamento da reparação do dano, considerando via da execução fiscal em matéria tributária. [32]
Inclusive em um processo existente na 7ª Vara Criminal de São Paulo, havia se manifestado o Ministério Público que a persecução penal só poderia ser firmada com recolhimento do tributo, entretanto, o juiz federal em opinião oposto no sentido de que o pagamento do tributo não é condição para celebração do acordo, uma vez que a lei autoriza proposta de outras condições como previsto no artigo 28-A do CPP. Assim, abre uma importante interpretação aos crimes tributários que sua reparação não é uma condição ao previsto acordo. [33]
{C}5. Conclusão
O tema proposto no presente artigo está longe de seu exaurimento e sem dúvida merece estudos aprofundados dos grandes juristas, mas, principalmente de uma reflexão do judiciário nos direitos e garantias fundamentais do individuo como sócio ou administrador da pessoa jurídica.
Não se pode olvidar que o judiciário é a última garantia ao empresário brasileiro contra qualquer ato arbitrário da administração pública, por outro lado, se vê entendimentos majoritários criando mecanismos coativos para cobrança de débitos fiscais, deixando as empresas a mercê da administração pública. Grande dificuldade à individualização de uma conduta criminosa na atividade empresarial, adotando como regra à condição jurídica da participação do titular da empresa, ao invés de buscar sua efetiva participação no evento criminoso.
Criando uma linha de raciocínio em que sócio ou administrador responde pelo crime pela sua condição na sociedade, deixando de lado se realmente concorreu para que o fato fosse praticado. Assim, atribui uma responsabilidade solidária somente porque o individuo ocupa gerencia da empresa ou faz parte da pessoa jurídica, punindo objetivamente, inviabilizando ampla defesa.
Realmente o panorama não é dos melhores, necessita de uma grande reflexão do caminho que o Estado busca para ver satisfeito seus créditos fiscais, criminalizando todo um setor crucial para sociedade, que já encontra prejudicada pela alta carga tributária e complexidade de suas obrigações acessórias.
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{C}[1]{C} PAIVA, Mariana Monte Alegre de – O Principio da Função Social da Empresa como Baliza à imputação da Prática de Crimes Contra a Ordem Tributária – Crimes Contra Ordem Tributária: do direito tributário ao Direito Penal. Organização Gisele Barra Bossa, Marcelo Almeida Ruivo. São Paulo. Almeida, 2018, pg. 21, 22, 23.
{C}[2]{C} SCAPIN, Andreia – Responsabilidade do Estado e do Agente Público por Danos Tributários – Crimes Contra Ordem Tributária: do direito tributário ao Direito Penal. Organização Gisele Barra Bossa, Marcelo Almeida Ruivo. São Paulo. Almeida, 2018, pg. 94.
{C}[3]{C} ESTELLITA, Heloisa. Responsabilidade penal de dirigentes de empresas por omissão: estudo sobre a responsabilidade omissiva imprópria dirigentes de sociedades anônimas, limitadas e encarregados de cumprimento por crimes praticados por membros da empresa. 1 ed. São Paulo. Marcial Pons. 2017. Pg. 37, 38, 39.
{C}[4]{C} CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 1. 10. ed. rev. e atual. São Paulo. Saraiva, 2006. Pg. 112,113,114.
{C}[5]{C} ASSIS, Augusto – A Responsabilidade Penal dos Sócios e Administradores no Âmbito dos Delitos Tributários – Crimes Contra Ordem Tributária: do direito tributário ao Direito Penal. Organização Gisele Barra Bossa, Marcelo Almeida Ruivo. São Paulo. Almeida, 2018, pg. 599, 600.
{C}[6]{C} PRADO, Luiz Regis – Direito Penal Econômico, 8. ed. Rio de Janeiro, 2019, pg. 292,293.
{C}[9]{C} ABDCONST, “Uma Aproximação às Formas de Responsabilidade Penal Individual em Empresas” (Apostila recebida no curso de Direito e Processo Penal com a professora Heloisa Estellita, Curitiba. Paraná, 2018, pg. 5,6, 7).
{C}[10]{C} ALMEIDA, Aranaldo Quirino de – Direito Panal Econômico e autoria no crime tributário em nome e no interesse da pessoa jurídica. 2.ed. Florianópolis. Conceito Editorial, 2015, pg. 89.
{C}[13] CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 1. 10. ed. rev. e atual. São Paulo. Saraiva, 2006. Pg. 116.
{C}[16]{C} SCAFF, Fernando Facury. Elétrica combinação entre Direito Tributário e Direito Penal, Disponível em: htttps:/www.conjur.com.br/2020-jul-13/justiça-tributaria-eletrica-combinação-entre-direito-tributario-direito-penal. Acesso em 14 de Julho. 2020.
{C}[18]{C} Processo: 0002263-49.2018.8.16.0035 – Ação Penal. 2ª Vara Criminal de São José dos Pinhais.
{C}[19]{C} LARA, Daniela Silveira. CARDOSO, Débora Motta. Os Sujeitos dos Processos Penal e Tributário: Problemática e Proposições – Crimes Contra Ordem Tributária: do direito tributário ao Direito Penal. Organização Gisele Barra Bossa, Marcelo Almeida Ruivo. São Paulo. Almeida, 2018, Pg.720, 721.
{C}[20]{C} MACHADO, Hugo de Brito. CURSO DE DIREITO TRIBUTÁRIO. 31ª ed. São Paulo. Malheiro, 2010. Pg. 179.
{C}[22] SCANDELARI, Gustavo.
Início do Prazo Prescricional em Crimes Tributários. Disponível em: https:/dotti.adv.br/inicio-do-prazo-prescricional-em-crimes-tributarios. Acesso em 15 de Julho. 2020
{C}[23]{C} Apelação Cível Nº 5029521-38.2019.4.04.7000/PR – Tribunal Regional da 4ª Região
{C}[25]{C} SCAPIN, Andreia – Responsabilidade do Estado e do Agente Público por Danos Tributários – Crimes Contra Ordem Tributária: do direito tributário ao Direito Penal. Organização Gisele Barra Bossa, Marcelo Almeida Ruivo. São Paulo. Almeida, 2018, pg. 118.
{C}[26] SCANDELARI, Gustavo Britta. O Crime Tributário de descaminho. Porto Alegre. Magister, 2013. Pg. 89.
{C}[28]{C} AGUIAR, Luciana Ibiapina Lira – Compliance e Governança Corporativa: É Preciso Reconhecer e Premias Boas Práticas – Crimes Contra Ordem Tributária: do direito tributário ao Direito Penal. Organização Gisele Barra Bossa, Marcelo Almeida Ruivo. São Paulo. Almeida, 2018.
{C}[29]{C} SCANDELARI, Gustavo Britta. O Crime Tributário de descaminho. Porto Alegre. Magister, 2013. Pg. 87 e 88.
{C}[31]{C} CARVALHO, Cristiano Rosa de. BUENO, Reginaldo dos Santos – Responsabilidade do Estado e do Agente Público por Danos Tributários – Crimes Contra Ordem Tributária: do direito tributário ao Direito Penal. Organização Gisele Barra Bossa, Marcelo Almeida Ruivo. São Paulo. Almeida, 2018, pg. 239, 249